Documentos de 2007 mostram que Ministério Público poderia ter evitado tragédia na região serrana
A análise do documento mostra que o Ministério Público estava realmente ciente da situação quando observada a data do carimbo e a assinatura da promotoria - 18 de setembro de 2007. A partir daí, o próximo passo seria apresentar o estudo aos órgãos competentes, como, por exemplo, a prefeitura. No entanto, nem o Ministério Público nem a Prefeitura de Teresópolis se posicionaram sobre o andamento do caso.
A região do Jardim Salaco é conhecida pela encosta da pedra da Tartaruga - que foi severamente atingida pela queda de mais de 50 barreiras, isolando dezenas de moradores no topo do bairro, que tem acesso apenas por duas vias.
A principal via de acesso, a estrada Michael Rucker, foi completamente destruída pela queda de mais de 15 barreiras (e que provavelmente não será reconstruída por ter ficado severamente arrasada) e a entrada pela rua Gustavo Parret ficou com mais de dois metros de lama, impossibilitando a saída e a entrada de ajuda até que a crosta ficasse mais dura e pudesse ser pisada de forma mais segura.
Segundo Lincoln, a área, oficialmente, não poderia ter sido habitada já que em 1997 ela foi inserida na “Área de Relevante Interesse Ecológico”, ou seja, tornou-se uma unidade de conservação e preservação ambiental, criada no âmbito municipal, através do Decreto Municipal 2.462.
No entanto, em 2000, o major Lincoln informou que houve a abertura de uma rua com máquinas da prefeitura, que efetuou ligação de luz, de água e de telefone. A prefeitura legalizou a presença dos moradores que ocuparam á área irregularmente levando serviços básicos à população, legitimando a presença dessas pessoas na região.
Ainda de acordo com o militar, em 2001, chegou asfaltamento da via. Isso porque em outubro de 2000 houve eleição, na qual o prefeito Mário Tricano foi reeleito. O asfalto foi uma promessa de campanha do então candidato.
Já em 2004, foi implantada iluminação pública nessas ruas e, em 2005, criaram uma linha de ônibus que chegava ao topo do bairro. O poder público, em vez de retirar todos os moradores em área de risco, criou condições para que os habitantes se estabelecessem na área.
Imagens da época mostram que a área realmente estava sendo invadida por loteamentos irregulares e pela exploração mineral, que causaram desmatamento e devastação ambiental, comprometendo o ecossistema e as condições de estabilidade das diversas encostas. Justamente este o principal motivo apontado por geólogos para os deslizamentos de terra.
O isolamento da população era evidenciado pelas tentativas do grupo de tentar manter as mínimas condições de higiene na região. Dezenas de moradores queimaram o seu lixo em uma área dentro do bairro para evitar que o mau cheiro e a sujeira trouxessem doenças e insetos ao local.
Para confirmar que o poder público estava ciente da situação das áreas de preservação permanente, o documento Agenda 21 Comperj já apontava que, em Teresópolis, era extremamente necessária a demolição de imóveis construídos nestas áreas. Assim como a realidade do Jardim Salaco, o levantamento revela que a ocupação em áreas de declividade acentuada é pratica comum.
Segundo o documento, em Teresópolis, existem áreas que sofrem com o desmatamento, agravado pela ausência de controle e rigor dos órgãos ambientais e falta de infraestrutura para treinar os fiscais ambientais.
O R7 procurou a Prefeitura de Teresópolis e enviou um e-mail com o assunto, a pedido da assessoria. Até a conclusão da reportagem, na noite da última terça-feira, (18), não houve resposta.
Já o Ministério Público, ao ser abordado, disse que precisava do número do protocolo para dar uma resposta ao questionamento. O pedido foi atendido, mas o órgão também não se manifestou sobre o assunto.
Tragédia das chuvas
O forte temporal que atingiu o Estado do Rio de Janeiro dia 11 deixou centenas de mortos e milhares de sobreviventes desabrigados e desalojados, principalmente na região serrana. As cidades de Nova Friburgo, Teresópolis, Petrópolis, Sumidouro e São José do Vale do Rio Preto foram as mais afetadas. Serviços como água, luz e telefone foram interrompidos, estradas foram interditadas, pontes caíram e bairros ficaram isolados. Equipes de resgate ainda enfrentam dificuldades para chegar a alguns locais.
Na sexta-feira (14), a presidente Dilma Rousseff liberou R$ 100 milhões para ações de socorro e assistência às vítimas. Além disso, o governo federal anunciou a antecipação do Bolsa Família para os 20 mil inscritos no programa nas cidades de Nova Friburgo, Teresópolis e Petrópolis.
Empresas públicas e privadas, além de ONGs (Organizações Não Governamentais) e voluntários, também estão ajudando e recebem doações. Os corpos identificados e liberados pelo IML (Instituto Médico Legal) são enterrados em covas improvisadas. Hospitais continuam com muitos feridos. Médicos apelam por doação de sangue e remédios. Os próximos dias prometem ser de muito trabalho e expectativa pelo resgate de mais sobreviventes e localização de corpos.
Em visita à região de Itaipava, em Petrópolis, o governador Sérgio Cabral (PMDB) disse que ricos e pobres ocupavam irregularmente áreas de risco e que o ambiente foi prejudicado.
- Está provado que houve ocupação irregular, tanto de baixa quanto de alta renda. Está provado também que houve dano da natureza. Isso não tem a ver com pobre ou rico.
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