Sergipano é o terceiro maior devedor do Brasil
'Devo não nego, pago quando puder'. Essa expressão popular é bem usada, mas de engraçada não tem muita coisa. Ou quase nada. Dever é coisa séria, e deve ser tratada como tal. Mas parece que uma boa parcela dos sergipanos prefere se fazer valer dela e seguir vivendo. Vivendo e devendo. Talvez isso justifique o índice de inadimplência por aqui, pelo menos no que se refere a cheques. Dados do Serasa revelam que Sergipe é o terceiro Estado brasileiro com maior número de 'borrachudos' devolvidos por falta de fundos. Seu índice na tabela é de 6,52%, perdendo apenas para o Amapá e para o Acre, na região Norte.
No entanto, apesar de Sergipe não estar 'bem na fita', esse dado revela outro detalhe, e desta vez positivo: a inadimplência com cheques tem caído muito em todo o país. Para os economistas do Serasa, a queda da taxa de inadimplência com cheques é reflexo da maior disponibilidade de linhas de crédito aos consumidores. Ou seja, com maior disponibilidade de crédito, os consumidores diminuem a utilização do cheque pré-datado como meio de financiamento o que, consequentemente, reduz o risco de inadimplência deste meio de pagamento, melhorando a sua qualidade.
Além disso, na opinião do economista e professor universitário Fábio de Moura, cartões de crédito, cheque especial e linhas de financiamento são exemplos de alternativas que estão sendo cada vez mais utilizadas pelos consumidores em detrimento do cheque pré-datado. "Isso acaba reduzindo o risco de inadimplência desse meio de pagamento específico", explica.
Mas e aí? O sergipano é ou não é um bom pagador? Na opinião de Samuel Rodrigues Schuster, presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas de Aracaju, que administra o Serviço de Proteção ao Crédito - SPC -, em Sergipe, em geral, ele é sim, um bom pagante. Mas Samuel ressalta, tentando atenuar: "Há casos de devedor profissional".
VELHACO CONVICTO
Samuel Schuster se refere àqueles em que o nome só sai do SPC quando passados os cinco anos previstos em lei. Hoje o SPC de Sergipe tem em seu cadastro cerca de 100 mil pessoas. "É melhor do que o resto do país, proporcionalmente", pondera Samuel. Ainda segundo dados do Serviço, por mês saem em média 25 mil pessoas, mas em contrapartida, entram outras 20 mil.
"A rotatividade é uma constante, mas este ano saiu mais gente do que entrou", salienta Schuster. O presidente da CDL também acredita que a queda na inadimplência sergipana esteja ligada à estabilidade econômica do país e a melhora da renda dos brasileiros. E isto é uma verdade. A economia do Nordeste seguiu a tendência nacional, apresentando expansão vigorosa, comparativamente ao mesmo período do ano anterior.
E este dinamismo da economia nordestina baseia-se na expansão da massa salarial, sobretudo em virtude do crescimento do emprego e da ampliação do crédito, aspectos presentes também em outras regiões do país. Mesmo assim, a região Nordeste é a segunda que mais deve, com um índice de 3,16%, segundo a Serasa. Portanto, o sergipano não foge à regra.
CHEQUES: O VILÃO
Outro importante fator que permite analisar a realidade de inadimplência em Sergipe é Indicador da Qualidade de Crédito do Consumidor - IQC -, fornecido pelo Serasa. O IQC é um indicador que avalia, trimestralmente, o risco de crédito dos consumidores. O indicador varia numa escala de 0 a 100, e quanto maior, melhor é a qualidade do crédito.
Trocando em miúdos: menor é a probabilidade de inadimplência dos consumidores. No terceiro trimestre deste ano, Sergipe apresentou um IQC de 78,28, sendo bem próximo ao IQC da Região Nordeste, que foi 78,4. Considerando os demais Estados do país, o IQC de Sergipe aparece em 13º lugar. O que não pode ser considerado lá essas coisas.
Mas quem bem sabe se o sergipano é bom pagador ou não é o empresário do ramo de colchões Rodrigo Barreto, administrador da BrasFlex. Com um 'buraco' na loja de mais de R$ 42 mil em cheques 'pendurados', Rodrigo diz que mesmo assim não poderia abrir mão dessa forma de pagamento.
"Meu lucro está todo parado. Mas se eu parasse de receber cheque, meu faturamento cairia 70%", revela. E isso faz cair por terra a ideia de que o bendito cheque vem ficando em desuso no Estado, perdendo terreno para os cartões de crédito. Mas os maus pagadores dão um bom prejuízo no negócio de Rodrigo Barreto.
"Cheques sem fundo não são regra, senão já teria falido. No entanto, ainda é mais seguro do que o boleto bancário", avalia, no ritmo do versinho do 'se correr o bicho pega, se ficar o bicho come'. E olhe que suas vendas são processadas a lojistas. Então ele tanto recebe cheques de pessoas jurídica quanto de física. Aliás, as empresas sergipanas também têm lá sua parcela de inadimplência.
Para Edilson Santos, gerente da unidade da DelCred Factoring em Aracaju, que recebe cerca de 600 cheques ao mês, o sentimento de responsabilidade do sergipano com relação a esta ferramenta está melhorando. "Os instrumentos de controle e restrições ao crédito também têm contribuído para um melhor critério da emissão de cheques sem fundo", opina Edilson. Ainda bem.
PERFIL DO CALOTEIRO
E quem deve mais em Sergipe, homens ou mulheres? Certamente os machões dirão que elas são mais inadimplentes. Mas não: os homens lideram o ranking da inadimplência. O economista Fábio de Moura cita um estudo sobre perfil do inadimplente realizado pela Telecheque que aponta que os homens representavam 50,81% dos devedores em atraso nos meses de março e abril deste ano, enquanto que as mulheres somaram 49,19% do total.
Mas isso não estaria proporcionalmente dentro da lógica de que a economia vaza mais pelas mãos dos homens que das mulheres? Já uma outra pesquisa, feita pela Rede Cheque OK, mostra que dos cheques sem fundos emitidos no país nos primeiros seis meses deste ano 52% o foram por homens e 48% por mulheres.
Então, não há como negar: o sexo feminino é mais preocupado em pagar as contas. Os dados mostram que eles apresentam uma tendência maior de endividamento. A comerciante Edineide Santos Pereira, 34, é um bom exemplo disso. "Faço o possível e o impossível, mas não deixo o meu nome ser negativado", diz.
Já o esposo de Edineide vive no SPC. "Ele entra e sai o tempo todo", revela Edineide. Na opinião de Eugênia Maria Cupertino Prata, gerente de uma financeira em Aracaju, onde cerca de 60% do público é feminino isso não é regra. Tanto homens como mulheres devem.
No entanto, o índice de inadimplência da financeira - que opera no mercado com cheques como garantia do cliente -, gira em torno dos 10 a 12%. O que para Eugênia Prata é considerado bom. "Se ultrapassar isso, a gente já vai ter prejuízo. Mas ligamos para o cliente e a maioria se preocupa em ter o cheque devolvido, para não perder a linha de crédito junto ao banco", detalha. E tem até mês específico para o sergipano dever mais. Segundo Eugênia, março é o campeão da inadimplência.
"As pessoas pegam empréstimo na virada de ano para gastos escolares e festas e depois ainda vem o carnaval. Mas quando chega março, tudo explode", diz a gerente. Já a financeira onde Ilma de Jesus Oliveira trabalha no setor administrativo, o mais seguro é lidar apenas com a forma de consignação, com desconto em folha. "É mais seguro. Neste caso o índice de inadimplência é zero", argumenta Ilma.
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